sábado, 10 de março de 2012

AS PRIMAS DO SONHO


- Adoraria que ele se chamasse Jorge e me amasse pela vida toda.
Disse a menina com os olhos cheios de esperança e  lágrimas. Os olhos prontos para entornar a água do desapontamento porque, mesmo jovem demais para entender, pressentia o fim sem começo, o ciclo descomeçado de quem sonha grande. Mesmo assim, ela tinha muito mais chances de sucesso do que a prima ali ao seu lado. Esta se encolhia ao ouvir a palavra "amor" como se pousasse sobre ela aspas invisíveis e a tornassem irreal. A obrigação de ser realista, de sobreviver à avalanche de sonhos inerentes a qualquer adolescente e o cinismo brotando no meio de sua alma a levavam para longe, longe demais de qualquer ilusão que lhe dêsse trégua.
As duas meninas, tão parecidas fisicamente e já tão distantes de alma, queriam ser apenas felizes quando crescessem. Uma talvez fosse médica famosa, a outra uma jornalista viajante. Os sonhos ali estavam, expostos e esperando que alguém os catassem e os acalentassem por um tempo, que fosse curto ou longo.
A prima com os olhos bem abertos riu com a menção do nome Jorge e o amor eterno. Já a outra visualizava o seu Jorge sorrindo e estendendo-lhe uma flor. O sonho é meu e ninguém tasca, pensava entre brava e sonhadora.
- Sim, ele se chama Jorge e me ama, ama tanto que vale por uma vida inteira.
Até mesmo a garota encolhida nos seus temores, de repente esticou-se com a afirmação da outra. Entre ciumenta e admirada, sorriu. Ora que fosse Jorge, Manoel, Peri ou Aristóteles. Que fosse por hoje, amanhã, dois meses ou cinco séculos. Para quem não se arrisca no sonho, tanto faz. Tanto faz os nomes, as cores, a duração, porque já enterrou suas chances de realização no fundo do poço do temor.
Mas havia esperança mesmo ali. Porque tão jovem, tão pequena nos seus erros, era ainda um campo inexplorado onde a fé ainda podia fazer morada.
Enquanto borboletas circulavam nos sonhos de uma, a outra calada suspirava e diante de tanta esperança começava a questionar seu céu sem estrelas. E o resto, o tempo contará....

Um comentário:

Anônimo disse...

Por que não ser inteira?
Duas meninas, desde jovens saindo de si, sonhando e não se encontrando.
Esperemos que elas descubram o poder feminino.