quarta-feira, 27 de agosto de 2014

EM ONDAS SEM FUGA


Respiração curta como se assim economizasse ar e intenção. Olhos fechados para tentar ignorar o ondular do dia. O mundo gira em compasso de quiálteras alteradas. Em claves quebradas, as sensações dominam tempo e espaço.
Um gole ou dois de revelação. Estremecer de pensamentos, rachar de certezas, avalanche de intuições.
Agonia encostada à parede. Mãos aflitas esperando alcançar o próximo momento. O que viria?
O clamor interno de quem já sabe o enredo, de quem já bordou as cortinas do destino. Gotas de chuva misturadas ao acaso, lágrimas secando sem tocar solo e alma.
Por dentro, o mundo. No tudo, o descompasso das horas. Aflita espera que se faz em pausas desconexas.
Veias segurando o acelerar da vida em mutante fluxo. Impaciente, deslizo entre o sim e o não. Há outra opção?

ESCÂNDALO


Na primeira página do jornal. Nas linhas virtuais de um site qualquer. A notícia em pólvora seu rastro transformou. Fogo seguindo seus passos. Queima de expectativa e desejo.
Todos já sabem. Escancaro esconderijo de intenções. Nem tudo será castigo ou consequência. Será talvez uma linda voz em lágrimas sufocada.
Manchete. Audiência. Demência. Eu acredito em tudo.Segredo desabrochado nas mil pétalas do seu sorriso.
Torço para que o caso seja abafado. Melhor que seja enfim revelado, arejado das suas vestes de pecado. Que se dispa de todos os senãos. Que permita espanto e alegria.
Prometo sorrir quando o enfim chegar. Dos seus olhos arrancar medo e censura. Surpreendo com nudez e insensatez. Nua e louca é a lua cheia que escandaliza céu e terra.

O ENCONTRO



Horas, sentinelas dos meus sonhos, apressem seu ritmo. Tirem-me da agonia que é ver a areia do tempo pesando sobre o vidro da ilusão. Desfaçam as ondas que aos poucos destroem meus castelos de areia. Não tenho tempo agora para ser racional andarilha. Meus pés recusam-se a abandonar a umidade das marés.
Os sentidos aquietam-se à beira do abismo. Que eu saiba olhar sem perceber o medo refletido no tremor dos meus passos. Alertas, possam me conduzir meus anseios ao lado de lá.
O eco em ondas repetindo luar e estrelas. No mar, as conchas recolhem som e sorrisos . A renda formada pelo sal em sua pele a bordar desejos.
Percebo cada momento aguardado e em segredo mantenho certezas. Direi todas baixinho como confissão indecente. 
Ah, horas que não passam! Se eu prometer sensatez, serão gentis? Corram, mesmo que mais tarde eu precise do tempo que renego agora. Eu sei, mas por ora, me deixem delirar com um amanhã que virá me encontrar. Estarei ali com o melhor de todos os sorrisos: amor.

O QUE JÁ FOI E O QUE SERÁ



O que antes era puro entusiamo virou espuma nas rochas. Desfez-se o laço do encantamento de tantos elos e suspiros.
Frágil instante que aos poucos tingiu de delicadeza a areia do tempo. Por ter sido assim, meio mágico meio sonho, deixou de existir. Em sal, conservado o sabor das recordações a reservar sorrisos para um talvez.
Não há tristeza, nem culpa, nem arrependimento. O que foi belo teceu rede para um futuro melhor. Para um outro momento chegar, em outro lugar. Para uma outra história viver, sem tanto passado guardar.
A alegria de recomeçar ilumina o caminho que ainda nem se insinuou. Hora de completar o mosaico dos dias com novas pegadas e coração leve.

ANTES DO ESPERADO


Desfaço as rotas programadas. Embaralho os planos traçados na areia do tempo. Despedaço bússola e pretensões. Haverá outro sentido no dia? Papel picado, sonhos espalhados, janelas abertas. Quero um pouco mais.
Esfrego sal, pimenta e atenção. Mãos feridas, intenção em quatro estações declarada. Decoro as gotas da chuva que ameaça cair. Quero mais um pouco.
Canso de tanto esperar. Meus olhos se fundem ao horizonte, alcançando o azul que nunca me pertenceu. As ondas não tocam a areia, evaporam na sua ausência. Quero mais de tudo.
Penso. Em sonhos, começo a viagem. De onde parto, não haverá marca no mapa. Choro. Despedidas diluem palavras e beijos. Parto. Livre como um feriado antecipado. Quero tudo mais.

OS DOIS LADOS


Depois de tanto procurar por aí um canto para acalmar fera e desejo, ela escolheu o inesperado. Rompeu com o destino no momento em que percebeu que dele nada mais viria. Não o que pretendia. Não o que buscava como pedra e caminho.
Feridos pés,mãos e intenções, permitiu-se sangrar. As cores misturadas ao sal do tempo. A chuva alagando sonhos que não sustentavam as primeiras gotas de desamor.
Devia esperar, todos lhe diziam. O que viria, então? Talvez o nada, talvez o que cobrisse de vez a escuridão. E se fosse apenas amor? Nada mais do que o tudo desnudando vida e ocasião?
De tanto pisar em mistério e desassossego, ela já não tinha ideia do que era dela confissão ou premonição. Metades iguais, perfiladas em reflexos conflitantes. Dúbias irmandades em passos lentos e fatais. As faces do que não se completa jamais. 
Depois de tanto crer e por fim desacreditar, o mundo lhe pareceu irreal. Um espelho com deformadas realidades. Havia o bem e o mal me quer. Um menino que conversava com lobos. Uma bruxa vestida de anjo e flor. Os dois olhos. Duas asas. Dois começos sem fim.

PEÇAS



Não procurava significado no silêncio. As pausas pareciam cruéis, prontas para despedaçar sonhos. 

Cismou, só isso.Quis adequar cenário ao personagem que surgia. Teimou que era ele o redentor do texto fraco e diálogo ridículo. De repente, tudo encaixava-se sílaba por sílaba. Tinha de ser assim. 
Com ele, desfiou os mantos da sensatez. Rasgou amanhãs sem temor. Quis acreditar, enfim, que era o melhor enredo. 
Deixou-se inaugurar, em sonhos transformada. Dali, poderiam surgir outros temas, muitos passos a seguir. 
Nem esperou o primeiro sinal para bordar interesse nas vestes e olhares. Fez-se muda, impaciente a acumular tempestade e urgência. 
Quando então, o teatro encheu-se de fantasmas, ela procurou em vão. O olhar que nele sempre buscara, ali se desencantava. A cortina pesava expectativa e desilusão. Da sua imaginação, cismara história e só. 
E o show a recomeçar, trocava personagens e amores. Os aplausos, se aplausos ouvisse , seriam para todos a negação do que ela criara. Ali não estava. Não tardaria a inexistir. Outro nome a rasgar destino ponta a ponta. The end.

DESTRAVAR


Tudo aquilo e mais um pouco. Travas, cadeados, senhas. A mente repleta de enredos prestes a acontecer. Avalanche contida por redes de raciocínio e lógica. Fantasias sob a lâmina fria da experiência. 
Poderia destranca
r portões com uma ou duas palavras. Ou talvez arrombar resistências com insistente sorriso. Permitir que o destino siga pelo caminho, que tudo conspire a favor.
Poderia se entregar, rasgar contratos, calar dúvidas e conflitos. Deixar afinal a areia movediça moldar os sentimentos. Aceitar beijos e abraços. Abrigar-se no oceano dos sonhos até perder o ar e debater-se em vão.
Deixaria ir sensatez e bom senso. Não mais em esconderijo seguro, a camuflagem dos dias ainda sem contar.
Descruzaria braços para caber em um abraço. Sem remorsos. Sem amarras.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

CISMA


Uma suposição. Arrepio que surge como insistente pergunta. A mesma. Sempre a mesma. De todas as respostas que me cobrem, nenhuma basta ao desejo. Desenhado em brasa, acomoda-se nas cores sem revelação. 
Escolho música, poesia, flores. Preparo o mundo para que pareça maior do que o caminho que seus olhos possam percorrer. Mergulho dúvidas em vasos de mel.Tenho os melhores momentos guardados em dobrados silêncios.
Tola, prefiro evitar essas ondas de sensatez. O corte prolonga-se na sua temida ausência. Cismo. Embriago-me de sonhos roubados de outra vida. Sinto o vazio. Sorrio anunciação e aguardo proteção. Há mais beijos do que espinhos. Sei que sim.
Estendo tapetes de folhas outonais. Todas nos tons da sua pele e voz. Convido sua vida a entrar, a encostar na minha. 
Que haja faíscas, que falhem os previstos senãos. De agora em diante, arda o que lhe agradar. Até eu dizer sim. Por cima do improvável desfecho. Por pura cisma. 

domingo, 23 de março de 2014

ADORNO


Ela sorriu com quase indiferença. Seus lábios simulavam tentativas de conciliação. De longe,via-se o encantar de uma nova promessa. 
O perfil era feminino, flor amarela no laço abraçando a cintura. Os olhos como asas azuladas, quase perenes.
Suas mãos pálidas a brincar com as linhas onduladas do vestido. Era uma mulher que trazia água no olhar e um toque leve de esperança no gesticular. 
Revirou  as páginas até se cansar da leitura dos dias. O sonho adormecido em um canto qualquer remexeu-se ameaçador. Como algoz felino a espreitar a passagem do tempo,movia-se de um estado a outro, em seu trêmulo querer. 
Os cabelos caindo em ondas, perdidos em um vai  e vem monótono de mar sem fim. Quis a moça refazer laços com um instante de magia. Imaginar-se esplêndida, cortesã de desejos e santa em intenções. Respiração suspensa, abrigou o destino. Sonho querendo forçar passagem. Sem pedir licença, invadiu pensamento e argumento. 
Insistente em não mais se perder, ela ainda balançou a cabeça, sacudindo a poeira de qualquer ilusão. Pôs-se a rir como se a loucura a impedisse de se contaminar com a felicidade.
Estrelas e flores contornavam sua imagem. Era tão bela quando assumia seu riso e graça. Adorável, louca em adorno contemplada. Uma mulher, enfim. 

sábado, 15 de fevereiro de 2014

TEMPERANÇA

A cena não parecia nada coerente. A mesa entulhada de pratos sujos, talheres arremessados em copos tombados e três garrafas de vinho quase vazias. No meio da grande entropia, algumas cartas de tarô espalhadas. 
Laura, por puro instinto, catou os arcanos já um pouco maculados por uma substância semelhante a sangue, mas que provavelmente era o famoso molho de tomate de Tia Cotinha. 
Logo percebeu que ali não estavam todas as figuras já tão conhecidas e gastas pelo descortinar de mistérios. Quantos namoros haviam sido revelados e até mesmo descartados através daquele velho oráculo?
Agora, com os pequenos retângulos nas mãos, Laura imaginava o destino reservado às cartas ausentes. Fogueira? Lixo? Esquecimento? 
Lembrou-se então da estranha figura do enforcado. Pendurado pelo pé e não pelo pescoço, simbolizava o sacrifício de algo em quase harmônica passividade. Ele faltava ali. Naquela mesa não havia oferenda ou renúncia alguma. 
Laura pensou em tudo o que deixara de vivenciar. Os dias de que abrira mão por simples descaso. A vida esfregada nas palmas das mãos, na tentativa de apagar um destino mal traçado. 
Desde de menina, soube sempre se controlar. Lidava bem com os seus conflitos, quase os calando. Era sempre assim, mesmo quando em plena ebulição dos instintos. Temperança de sentimentos trocados, em jarros dourados, como água cristalina. O constante fluxo, em mudança de continentes revelando a temperatura alterada. 
Sorriu para si mesma com quase indiferença. Seus lábios simulavam tentativas de uma conciliação com o tempo. De longe se via o encantar com a promessa de harmonia. 
De novo, Laura vestia-se em fantasias. Feminina, flor amarela no alto da cabeça, com as costas revelando asas azuladas, quase perenes.
Suas mãos pálidas brincavam com as linhas onduladas dos vasos cheios de água e esperança. Havia ali a aceitação muda da passagem de um estado a outro. De um desejo a um sonho. 
Na mesa esquecida, o vinho transbordava lento, em poças de alquimia. Metamorfose da vida que Laura somente contemplava. 

domingo, 5 de janeiro de 2014

DESPEDIDA


Oi, moço. Quando menos esperava, você se tornou ancião e nem me deu tempo de me acostumar com o seu envelhecer. Portanto, para mim, continuará moço. 
Sei que tivemos nossos momentos de tensão, de desentendimento, conf
lito de agendas. Claro que os dias gastaram seu viço e empurraram suas esperanças pelo vão do acontecer. 
Eu sei, não foi totalmente sua culpa. Eu olho para você, sumindo assim aos pouquinhos, bem a minha frente, me tornando mais velha também. Que modo de se despedir, tudo aos bocados como goles mal dados. 
Sei que amanhã ainda acordarei com você. Estará a me espreitar com ares de moribundo, sentindo pena de si mesmo, saudade do que não viverá comigo.
Ah, entendo que precisa mesmo ir. O novo logo ali já começa a acenar. Tem pressa de se exibir. As pessoas aguardam por ele e esquecem de você sem remorsos. Tornou-se obsoleto, velho, inadequado, cheio de lembranças que não se apagam com borracha nem lágrimas. 
Por mim, ficaria mais um pouco. Foi bom comigo, me permitiu reencontros, novos desafios, me livrou de mim mesma tantas vezes. Sinto muito não poder estender a hospedagem. Não depende de mim. Grite com o Senhor Tempo, arrume um segundo plano, um terceiro talvez. 
Sentirei sua falta. Talvez nem tanto, pois estarei ocupada com o outro, recebendo-o com honras e sorrisos. 
Não é ingratidão, 2013, somente a necessidade de seguir em frente. Valeu o tempo juntos. Não me negue um último sorriso. E, por favor, ao sair, não bata a porta.

SONHOS


Tenho sonhos impossíveis. Embriagados contos de fadas. 
Às vezes, um unicórnio me fala. 
Às vezes, um cavalo alado me salva. 
Do dragão jamais fujo, já que dele sou o fogo que escapa. 
As fadas madrinhas são borboletas que me ungem de óleo e inspiração. 
De onde vem aquela bruxa? Dos meus caminhos internos tão sagrados. 
Também te encontro nesse capricho doido. Sorrindo, nos cumprimentamos
com essa tal felicidade. 

OUTRO BAILE

 
Sei que não é certo, mas vim assim mesmo. Faces desnudas, coração disparado, esperança contida. 
Deveria ter usado uma das máscaras que me ofereceram, mas não me caíram bem. Todas parecem uma mistura dos boatos em que nunca acreditei. 
Por isso, este rosto que vê é meu. Estas linhas que se harmonizam e desafiam são minhas também. 
Passei aqui quase por acaso. Um sem querer repetido tantas vezes que já decorei o endereço da indiferença. Tanto faz, diz a plaqueta logo na entrada. 
Bater novamente na mesma porta é uma opção. Minha, também. 
Quem sabe seja hoje o dia? Quem sabe se abra a oportunidade? 
Não me ofereça qualquer disfarce. Não uso máscaras e me despi de todas as fantasias. 
Esse será um outro baile. Quer dançar comigo?


OUTRA SEGUNDA


Ela lentamente se posicionou no seu contrário. Queria ter forças para desafiar o dia para um duelo. Sorriu debochando do que viria, do que se instalaria como a sua realidade. Tinha preguiça, desconfiança, mas nenhuma culpa. A culpa é para os fracos, repetia sua mente.
Era mais uma segunda-feira que se revelava em cinzas. Já passados e finados os dias que pouco valiam. Ela agora contava as horas para mais uma lua explodir em dragões e guerreiros. Salve, Jorge! O seu Jorge, que aos poucos, deixava de ser sonho para sucumbir em crateras.
A chuva anunciava luar desconhecido. A tarde estaria a brincar com suas dúvidas e questões particulares. Pensou em jardins, mas as flores respingadas encolhiam-se sem cor. Lembrou-se de florestas, mas só enxergou as flechas cravadas nos troncos mais altos. Resolveu não pensar, já que agora era toda sentir.
Mais alguma espera e tudo seria noite. Para cobrir a expectativa de algum efeito. Era o moço suspeito, mas sem provas, ela o libertou.
Não devia ser assim, o eleito. Era mais sombra do que presença.
E a chuva a lavar o dia, carregou mais do que depressa, os minutos que lhe entristeciam. Molhada, se fez contente. Já que era essa sua opção para o presente.


CINCO PIANOS E VINTE E UMA PORTAS


 
Era uma casa diferente, nem engraçada, nem torta. Na verdade, estava mais para encantada. Com seus cantos e poucas quinas, abrigava família e sonhos. Ah, quanto encanto pelos corredores!

O lar daquelas cinco mulheres em roda e apenas dois súditos. Eles, cavalheiros não menos importantes, acostumaram-se ao feminino domínio. A casa das cinco mulheres e seus cinco pianos. As teclas vizinhas, as meninas tão próximas e a música tomando conta do que ali se chamava vida.

O jardim mínimo crescia e, sem espaço, invadia tudo o que podia alcançar. Um esboço do que seria um secreto recanto, de onde surgiriam joaninhas pintadas de carmim. Talvez pela explosão de cores e a delicadeza de pétalas, alguma das meninas cresceu achando que a beleza das flores fosse triste porque findava.

As paredes de concreto não deviam ser. Talvez fossem de claves empilhadas e tivessem alguns acordes como pilares. Tijolos não havia ali. Sonhos trançavam melodias e se ouvia de longe contos de fadas transformados em canções.

Há quem diga que aquele castelo nunca existiu e que alguém errou na contagem das portas. Não eram vinte e uma, talvez vinte, quem sabe? Mas a menina repetia a tabuada do três e lá vinha a ladainha – três, seis, nove, doze, quinze, dezoito, vinte e um. Três vezes sete. Três vezes o sete como as cores do arco iris, pois aquela era a família que encantava.

Com tantas portas, havia de existir alguma trancada. Ora, ali não havia disso não. Se chuva não aborrecia, as janelas se abriam hospitaleiras para borboletas e pássaros. As portas não mereciam trancas, pois eram de fato vinte e um portais mágicos.

Enquanto a Rainha Mãe preenchia a lenda de compassos memoráveis, as meninas dedilhavam sonhos que nunca mais esqueceriam. Senhora do império infinito reunia as filhas em volta das pilhas de partituras preferidas. Nota por nota, decoravam os olhares maternos como ostras alquimistas. Depositariam pérolas onde só se via areia. Um grão. Somente um grão e a joia dali brotava. Era mais amor do que valor.

As chaves escondiam-se no vão dos dias. Não tinham serventia, já que ali não se fixavam segredos. Vinte e uma voltas, de todos os meses transformados em anos. Meninas ganhando vestidos de festa, bordando recordações em lenços de renda. Pequenos bilhetes rabiscados com as risadas das fadinhas em sapatilhas de ponta. Cresceram, em sorrisos multiplicados, em romances vivenciados, seguras do amor herdado.

Pianos recebiam escalas e carinhos. Mais um solfejo que amanhecia alegria. Dos arpejos aprendidos, eram vinte e uma as sombras que na melodia se escondiam. Espelhos de cristal, espalhavam reflexos dos cinco pianos. O que havia ali ninguém contou, apenas se revelou.