domingo, 11 de dezembro de 2011

BREVE ENSAIO SOBRE A PAIXÃO PLATÔNICA


Bastaram os primeiros acordes de uma velha canção para levantar o véu das lembranças. Era um capítulo esquecido, abandonado à própria sorte, condenado à inanição e escravizado pelo tempo. Metodicamente dobrado em mil partes para caber em uma gavetinha lá no alto, longe de mãozinhas curiosas.

Quem já não teve uma paixão platônica? Dessas que nos fazem corar sem qualquer aviso? Dessas que deixam incrédulos os mais românticos cidadãos?

A minha, talvez única, foi coisa dos anos 80. Por isso, a música despertou sua lembrança. Falo de um tempo em que não havia internet, essas facilidades de e-mails explicativos e mensagens instântaneas. Um tempo de demora nas respostas, de ausências mais sentidas e de cartas. Sim, cartas. Ah, nunca tinha me visto assim tão donzela do século XIX, tropeçando na saia do meu vestido e me abanando com uma carta manuscrita. Isso, letra cursiva sobre papel, não na tela do computador.

Tudo começou com uma foto vista pelo meu... aham....sei lá. Não nos encaixamos em nenhuma definição de relacionamento. Nem amigo, nem namorado, nem amante, nem inimigo. Ah, será então meu querido desconhecido.

Quando meu querido desconhecido viu minha foto 3x4, preto e branco, com 12 anos, caiu na besteira de elogiar minha imagem. E se as notícias não voavam naquela época, pelo menos correram o mais rápido possível e chegaram a mim. E eu o convidei para minha festa de aniversário de 13 anos, com um convite de tema quase infantil. Esperei, ele não veio... os amores platônicos nunca vêm. Isso é um fato.

Trocamos pouquíssimas cartas. Quer dizer, pouquíssimas da parte dele e um lote maior da minha. Isso se repetiu em outros relacionamentos, ou ensaios de relacionamentos o que me tornou uma pessoa que não espera correspondência ou troca de mensagens. Eu escrevo, mando e-mail, se houver resposta, oba, se não houver, acho normal. Pode ter sido chato, mas agora me livra do peso da expectativa.

Pois, os anos se passaram e não obtive mais rastro algum do meu querido desconhecido. Às vezes bate uma brisa de nostalgia, de saudade de uma inocência que não me acompanhou... às vezes, me pergunto se algum dia, em algum lugar, em alguma circunstância nos encontraremos, nos olharemos e caíremos na risada, numa estrondosa gargalhada de tão ridícula a nossa não-história. E escreveremos juntos um parágrafo de encerramento, que não seja “felizes para sempre”, mas "eternamente ligados pela impossibilidade do tempo e do espaço". Finalizaremos com um beijo, casto, claro. E seremos felizes, sim, cada um pro seu lado, reescrevendo sua própria vida.

4 comentários:

Ana Ribeiro disse...

Que lindo! Só o título me despertou uma memória que achava que não existia mais e por encanto me conduziu a leitura. Texto sensível e eterno!Parabéns, Claudia!

Lúcia Carvalho disse...

Adorei !Estar apaixonada é sempre muito bom!

Anônimo disse...

Feliz de quem nesta vida, amou de verdade....
Acredito que a "platônica" seja uma das formas de se amar, e ainda mais saudável do que a mais nova forma encontrada...a "virtual".......pelo menos a platônica existe por recursos reais e próprios, ainda que entre o mundo dos sonhos e da realidade. Parabéns amiga pela forma clara que você coloca esta vivência, e pela beleza de mostrar outras possibilidades de amor....
bjs/Elaine

Lan
Elaine N. B. Agostini

Anônimo disse...

Sabe, muito interessante seu texto. Qual de nós não sentiu aquele friozinho na barriga ao sentir-se atraído por alguém. É mágico. Estar apaixonado é sofrido e prazeroso ao mesmo tempo. Parabéns pelo texto.