quinta-feira, 23 de agosto de 2012

A PROMESSA

 
Ele nada disse. Seus olhos também não traziam ilusões. Mesmo assim, havia algo subentendido em cada pulsar, em cada toque estendido, em cada sorriso. Era como se ali, o tempo derretesse e perdesse todo o sentido.
Ela procurou não guardar as palavras. Deixou-as expostas no varal da razão para que sempre pudesse delas lembrar com clareza. Cada sílaba desprovida da emoção do momento, do calor do acontecimento, da magia do encontro. Era preciso sim, dessecá-las friamente, roubar-lhes o núcleo, decifrando cada enigma que insistia em se instalar em meio aos sons. Eram mais do que gemidos, eram acertos e erros revelados em arrepios. Podia sentir sua presença neles, como sombras e luzes que se espalhavam pelo seu corpo.
Queria adormecer e ter a chance de sonhar impunemente. Sem julgar os próprios sentimentos que se embaralhavam em rodopios velozes. Ele a tornava cúmplice de um crime ainda não cometido, pois a convidava para o novo, para o inusitado salão do sentidos. Agora, ela sorria, ciente de que nada mais lhe pertencia desde que seus olhos se ocuparam dele. Não, ele nada prometia. Mas ela já fizera promessas demais a si mesma. Ora, desviava o olhar dos próprios planos na certeza de não poder cumpri-los.
Havia uma lentidão estabelecida entre seus pensamentos que se esvaziavam com cada suspiro. Como se anunciasse o próximo passo com toda cautela de quem evita quebrar vidro. E ela tinha receio de pisar nos cacos, pois refletiam suas cores e dores. Afiadas sensações lhe vinham agora, rasgando as palavras em pedaços de  tudo o que queria. Ah, ela queria ainda mais desde sempre. Queria que houvesse uma realidade maior ou pelo menos, uma jura revelada naquele olhar. Era tudo simples, desejo imediato mergulhado em votos secretos. Tudo resumido em uma só proposta: a promessa.

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