sexta-feira, 5 de abril de 2013

SEM FACE

Abro janelas com insistência. O vento vibra vidro e apreensão, em estilhaçados pressentimentos. Quente, mormacento, envolvente abraço de despedida. Há um porquê diferente na paisagem. Uma necessidade de fuga. Cores mesclando-se no horizonte, como que confusas com o porvir.
Que eu esteja errada. Que seja apenas uma tempestade querendo atirar areia e sal na rotina. Porque sinto algo estremecer sob o meu corpo. Infiltra-se como receio recém acolhido. Por mais que eu bata os pés, o pó não desgruda da minha pele. Impregnada de acontecimentos tardios estou.
O ar circula desconfiado. Não há brisa calma nem deslizar de nuvens no céu. Revejo minhas memórias de moinhos distantes. Elas não mais existem. Pás cortam o nada, cavam o desconhecido momento final. Pás de moinhos. Pás que retiram terra. Pás que nunca são apenas paz.
Agarro-me às palavras como se fossem raízes de algo que já se perdeu. Âncoras de um bem querer que se recusou a seguir viagem. Por muito tempo. Tempo demais, talvez.
Dobro bandeiras, recolho armas, cubro móveis e sentimentos. Há tanto nada neste momento. Há tantas malas impedindo a saída. Ou será a entrada?
Cada minuto traz consigo um bilhete rabiscado do destino. Decifro a caligrafia mal posta com lentes de lágrimas. É muito pouco para quem percorreu todo o caminho. É mais um golpe. Misericórdia perdida pelo esquecimento do sentir.
Dói de forma aguda, quase apunhalada. Não há como revidar tapas. Não há proposta, causa ou resposta. Não há outra face. Não há. Face alguma. 


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