segunda-feira, 4 de maio de 2015

QUANDO A CHUVA CAI



A luz atravessa as nuvens, depositando fagulhas em suas ondas. O ar torna-se quase rarefeito, silencioso debandar de folias. Os animais acolhem-se entre agitados prenúncios. 
A menina guarda as bonecas no armário. Detém suas expectativas para depois. Os sonhos ali empilhados como brincadeiras futuras. 
No varal, a roupa balança ao vento. O branco dos lençóis reflete a intenção de paz. Mãos desfazem nós, retirando do varal vestimenta e promessa
Os primeiros pingos chegam ao chão. Evaporam como estrelas cadentes. A água alisa a terra, amacia suas entranhas, renega sua secura. Os veios d'água misturam-se ao entardecer precoce. 
Há luz por todo o trajeto. Mulheres atravessam arcos de jasmim, levando seus sorrisos como graças.O céu revela-se brusco sem azuis delicadezas. 
As mãos antes unidas em oração, estendem-se receptivas e amigas. Abrigam oferendas líquidas que, entre os dedos, escorrem ao princípio sem fim.
Gotas pesadas chicoteiam paisagem e ilusões. Dissolvem-se no vão das palavras represadas em diminutas revelações. Não é tarde, nunca foi. 
A água lava o que já se revelou vazio, o que já perdeu razão. Os dias partem em fluxo contínuo. Mergulhos no destino de quem se permitiu ser real entre mentiras e cortes traiçoeiros. Chove!
No balanço, sob a árvore, uma única flor repousa. Pétalas esmagadas pelo peso da chuva que a tudo toca. A menina corre e recolhe o que nunca será de mais ninguém. Seu sorriso molhado, suas mãos vazias, a verdade sem travas, tudo gira em um segundo. Haverá mais voltas, ela sabe. Por enquanto, entrega-se ao porvir e sorri. Quando a chuva cai.

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