sábado, 26 de janeiro de 2013

VESTINDO A VIDA

Disposta a passar por ali. Preparada para ficar onde houvesse espaço. Ela estendeu suas propostas pelo asfalto da realidade. Porque o real é o concreto. Às vezes, queima os pés. Outras vezes, rasga promessas rolantes. Pouco importava quantos sonhos havia depositado sobre a  sua realidade, pois sempre sustentava o olhar para o que podia ser.
A vontade agora era de sentar. Ali mesmo, no chão mal varrido, mal lavado, por tantas chuvas percorrido. Sentaria e se calaria. Quando se tornasse invisível como a noite que engole o dia, pensaria no que lhe atormentava. Precisava inexistir para poder parar os minutos da inquietação. Deixar de ser para poder talvez crer.
Não, ela não estava desistindo da vida. Muito pelo contrário, agarrava a vitalidade do momento com garras felinas. Não era só amor. Era determinação. Por isso, precisava tanto do vazio, do silêncio, do escuro, para despir os conceitos contaminados pelo ócio do querer. Ainda teria de desfazer as bainhas de todas aquelas saias tecidas pelo tempo. Véus seriam rasgados e lançados ao vento como aviso às imprudentes negativas e culpas.
Quase nua. Soltando os fios do destino presos aos seus desejos. Desatando os nós dos sentimentos abrigados em cavernas do passado. Quase oculta. Perdendo os medos e desafiando os presságios que ali se instalavam. Era lua em formação nas brancas escolhas e prateadas presenças. Era toda completa por não se querer mais em nada inteira. Era o avesso do que já tinha sido. A verdade desnudada e exposta como madrugada apressada.
Agora, sem mais querer, sem mais nada a temer, ela encostava no impossível. Brindaria luares e estrelas antes de anunciar o sol. Aos poucos, cobria-se de fé, de cores festivas e sorrisos desbravadores. Bordou as iniciais daquele que a faria seguir mais leve. Alisou as pregas das muitas intenções que lhe enchiam a mente. Enrolou-se em finas camadas de expectativas.
De novo o mundo, de novo o tudo. Bebeu sem pausa. Em goles grandes, cheios, daqueles que preenchem a boca e desorientam qualquer fome a mais. De volta ao intocável, ao incoerente domínio das emoções que transbordam o cotidiano.  Assim luz, de flor em flor, trajada de vida.
 


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