quarta-feira, 7 de agosto de 2013

EM DESALINHO

Já quis ser mais. Muito mais. Envolta em suas próprias promessas e alguma ilusão de ego, ela desejou ser outra. Aquela que não soube abrigar. Que se perdeu no tempo por desconhecer quem de fato era. 

Dor, caminho sem chão, mesa sem cadeira, esperança de tolo. Ela saberia entender, dividir as horas, fazer paz e guerra sem piscar duas vezes. Ou talvez não. Já era em pedaços desperdiçada. Por sina, emprestada à incomodação.
Desejou demais. Aceitou de menos. Alcançou o que deu. E pouco cedeu. Assim, fez seus olhos o mapa do deserto. Completou palavras cruzadas de outro. Sujou louça com expectativas e lavou vidraças com lágrimas. O estranho lhe pareceu tantas vezes lar.  
Desejou chão e mar ao mesmo tempo. Foi mais oceano do que porto. Se a natureza carregava a culpa, ela se encolhia sem respostas. Não queria assim. Amarras e cortes. Doces que azedavam com o calor dos dias. Ela azedou. Perdeu pétalas e sonhos.  Ficaram todas espalhadas em solo arenoso. Porque outra primavera viria. 
Cobriu espelho e alma. A luz infiltrava-se como conforto e trégua. Vinha para dizer que já bastava. Que não precisaria mais rasgar planos e beijos. Que era mesmo preciso ir, de lá estrear nova partida. Juntar coragem e não aguardar mais. Ser o olho do furacão e esquecer a paisagem. Não olhar ferida ou destroço. Era fim.
Caminharia pela beirada do abismo, desafiando eco e vazio. Porque dela dependiam resposta e saga. Em retas, não saberia mais seguir. Tinha as costas doloridas com o peso do que vivera. Largar, desistir de transportar ilusões era o mais difícil. Perdoar seus passos, desalinhar intenções. Apagar marcas e sinais da sua presença. Fingir não se importar em partir. Mas se importava. E muito.
Já era tarde. Partiria, com novas cicatrizes, novos humores, deixando sobre a mesa, chaves e afeto. Sabendo que era o certo. Em torto entendimento, mas o certo. 

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