quinta-feira, 11 de julho de 2013

ÀS CEGAS


Desejou que a noite não chegasse tão cedo e que a tarde se estendesse generosa por mais algumas horas. O tempo suficiente de produzir luz pelo caminho restante. Não haveria lanternas à disposição. Não teria respostas a lhe guiar. Era toda dúvida e pressa. Seus pés pareciam seguir em ritmo próprio sem que sua mente pudesse acompanhá-los. 
Enfim, chegou. A lugar desconhecido, sem placas ou anúncio da sua presença. Optou pela experiência inusitada. De olhos vendados pela ignorância, adentrou o silêncio. Sem tato, sem perfumes a lhe provocar instinto de fuga, desceu degraus com receio de cair ou talvez desaparecer.
Instalou-se no caos. Parte daquilo também parecia ser sua por direito. O atraso, a fuga, a deslocada realidade, tudo a mantinha ali na expectativa do próximo minuto. Do alto, veio o aviso, um eco desencontrado de reconhecimento. Ela percebeu-se liberta de qualquer desassossego. Enfim, um pouco de luz roubada da tarde que se findara. Ela voltou os olhos para que se refletissem acolhidos. E passos seguiram-se acompanhados de cuidados velados.
Próximos o bastante para serem notados. Mãos estendidas, acolhidas, ungidas com óleos imaginários. Na impossibilidade de abraços, palmas se abrigavam, linhas se completavam. Apresentação informal, táctil e benigna. Calor trocado, delicadezas provadas em sintonia. 
Deixaram os compassos tocarem espaço e tempo, sem pausas para abstrações. Fosse quem fosse, ela ali estava. Sem domínio ou trégua. Repleta de suposições que lhe acariciavam a vaidade. Assim,  surgiu o primeiro argumento silenciado boca a boca. Paciência posta à prova, pressa retida a tempo de se deliciar com a descoberta. 
Tão acostumados à escuridão, supunham-se iluminados por algumas estrelas recém-colhidas. Quietos, embriagados com palavras não ditas e pensamentos revoltos, deixaram-se ficar na esperança de uma completude que talvez ali se anunciasse. Já não era mais dia. Havia ali o preparo do céu para a noite que caia em desmaio. Cores tingindo nuvens, sustentando uma lua envaidecida, orgulhosa de abençoar encontro e entrega . Posto assim, sem lágrimas, apenas sorrisos, o dia terminava sem direção, em cego abandono, completo por si só.  



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